O anúncio de que a Ucrânia aceitou a proposta americana de um cessar-fogo de 30 dias representa uma mudança no xadrez geopolítico de um conflito que o presidente dos EUA, Donald Trump, já classificou como “ridículo”. No entanto, a verdadeira questão é se Moscou seguirá o mesmo caminho ou insistirá em suas exigências territoriais maximalistas. A recusa de Vladimir Putin em respeitar a soberania ucraniana desde 2022 provocou uma destruição que agora, ironicamente, pode colocá-lo contra a parede. A Ucrânia, por sua vez, se vê forçada a um pragmatismo estratégico, aceitando negociar sob os termos de Trump, cujo relacionamento cordial com Putin gera preocupações em Kiev sobre sua idoneidade como mediador.
O Kremlin sempre sustentou que está aberto a negociações, mas seus termos permanecem pouco conciliatórios. A insistência russa em manter o controle das regiões anexadas e a inflexibilidade diante de qualquer recuo tático sugerem que o governo de Putin pode não estar genuinamente interessado em uma paz duradoura. Para os falcões de Moscou, qualquer concessão será vista como traição. Por outro lado, o custo humano e econômico da guerra tem sido insustentável, e um cessar-fogo, ainda que temporário, pode ser uma tábua de salvação para um regime sob sanções pesadas e crescente desgaste político.
Para Kiev, aceitar uma pausa nos combates pode ser interpretado como um sinal de fraqueza, especialmente diante de um Trump que já deixou claro que a paciência americana não será infinita. O presidente Volodymyr Zelensky enfrenta o dilema de preservar sua posição perante o eleitorado ucraniano enquanto busca manter o suporte dos EUA, agora sob uma administração menos entusiasmada com a defesa irrestrita da Ucrânia. O recente embate com Trump na Casa Branca reforça o quão frágil é essa aliança.
O apoio americano, aliás, tornou-se uma moeda de troca perigosa. A proposta de Trump de explorar os recursos minerais ucranianos em troca de ajuda militar coloca Kiev em uma posição delicada: aceitar um acordo que permita pagar os bilhões de dólares enviados pela administração Biden ou arriscar perder seu principal aliado internacional. Se antes Washington era visto como um parceiro incondicional, agora Kiev precisa lidar com um governo que exige contrapartidas que vão além da retórica diplomática.
Enquanto isso, a Europa observa com apreensão os desdobramentos das negociações, sem participar diretamente do conflito nem da solução. O plano do francês Emmanuel Macron de enviar uma força de paz para a Ucrânia demonstra a inquietação do continente com a possibilidade de um acordo conduzido exclusivamente pelos Estados Unidos e pela Rússia. Apesar do apoio financeiro e militar a Kiev, a União Europeia continua sendo um ator periférico nas tratativas, incapaz de influenciar decisivamente os rumos da guerra.
Se Putin aceitar o cessar-fogo, será um reconhecimento tácito de que sua “guerra relâmpago” se transformou em um atoleiro sem saída. Se rejeitá-lo, reforçará sua imagem de um líder inflexível, desinteressado em qualquer solução pacífica, permitindo que os EUA ampliem seu apoio militar e financeiro a Kiev para continuar com os contra-ataques. No entanto, o problema central dessas negociações não é apenas a postura do Kremlin, mas também a crescente influência de Trump sobre o destino da Ucrânia. Entre um Putin que busca expandir suas fronteiras e um Trump que deseja cobrar dívidas com recursos do solo ucraniano, Zelensky caminha sobre um campo minado, tentando garantir a sobrevivência de sua nação sem comprometer sua soberania.
O que estamos testemunhando não é apenas um impasse militar, mas um jogo geopolítico de alto risco, no qual a vida de milhares de pessoas serve como moeda de troca. Putin reluta em admitir a exaustão de sua máquina de guerra, Trump se apresenta como o grande negociador e Zelensky luta para preservar a dignidade de um país devastado. Entre interesses e egos, a paz permanece uma promessa frágil, refém da vontade de líderes que parecem mais preocupados em garantir sua própria vitória do que em realmente pôr fim ao sofrimento humano.