Durante anos, José “Pepe” Mujica encantou o mundo como o “presidente mais pobre do mundo” — uma figura austera, com seu Fusca azul e fala mansa, que inspirou jovens progressistas do Brooklyn a Buenos Aires. Mas sob esse verniz de simplicidade, existe um legado complexo, frequentemente ignorado pelos que preferem mitos a fatos. Mujica foi um dos mais eficazes propagandistas do projeto de poder da esquerda latino-americana — um projeto que, quando implementado sem freios institucionais, termina invariavelmente em autoritarismo, miséria e repressão.
Ex-guerrilheiro tupamaro, Mujica jamais se desvinculou totalmente de suas raízes ideológicas radicais. Ao contrário do que seus admiradores querem crer, sua suposta moderação nunca significou neutralidade. Ao longo de sua carreira, Mujica teceu laços profundos com líderes que representam o que há de mais retrógrado na política do continente. Foi íntimo de Fidel Castro, cujo regime aniquilou a liberdade de expressão, proibiu sindicatos independentes e encarcerou dissidentes. Foi aliado entusiasta de Hugo Chávez, cujo regime destruiu a Venezuela e gerou uma crise humanitária sem precedentes. E, como não poderia deixar de ser, foi mentor político de Lula da Silva — hoje, protagonista do retorno de um projeto de poder de esquerda no Brasil que despreza as liberdades e flerta com as piores ditaduras do mundo.
A imagem pública de Mujica, cuidadosamente construída, contrasta com a realidade de seus atos. O próprio crescimento de seu patrimônio — mais de 70% em dois anos — contradiz a narrativa de extrema pobreza com a qual foi retratado internacionalmente. Pior que isso, como presidente, criou o FONDES, um fundo estatal que prometia fomentar empresas autogeridas pelos trabalhadores, mas que, na prática, drenou recursos do Banco República para projetos ineficientes e mal fiscalizados. Em nome da “justiça social”, Mujica favoreceu uma redistribuição de recursos feita à margem da meritocracia e da transparência, favorecendo companheiros ideológicos sob o manto da retórica progressista.
Em um mundo onde a confiança nas instituições é cada vez mais frágil, o apelo de Mujica reside no contraste entre seu discurso e a opulência e arrogância de muitos líderes políticos. Mas esse contraste é enganoso. Mujica sempre defendeu ditaduras de esquerda e relativizou violações graves de direitos humanos — desde que fossem cometidas por “companheiros de luta”. Para ele, a repressão só é condenável quando vem da direita. Essa seletividade moral revela o cinismo embutido no discurso que finge defender os pobres, mas na prática os instrumentaliza para projetos de poder personalistas e antidemocráticos.
É nesse contexto que figuras como Jair Bolsonaro no Brasil e Donald Trump nos Estados Unidos ganham relevância — não porque sejam perfeitos, mas porque representam uma ruptura com esse sistema viciado onde a esquerda detém o monopólio da virtude e qualquer crítica vira “ódio”. Bolsonaro teve a coragem de desmascarar as alianças obscuras do PT, enquanto Trump confrontou de frente o establishment globalista que romantiza líderes como Mujica e demoniza qualquer pessoa que defenda as liberdades individuais, economia de mercado e soberania nacional.
A imprensa internacional, em sua maioria, continua cúmplice dessa romantização. Mujica é tratado como uma relíquia simpática da política, enquanto suas amizades com ditadores e seus erros administrativos são ignorados. Mas a história cobrará sua conta — como já cobra de Cuba e Venezuela. E quando isso acontecer, não será surpresa ver que o homem que tanto falou em “liberdade” ajudou a perpetuar justamente os sistemas que mais a negam.
O legado de Mujica, portanto, deve ser revisto com honestidade. Não se trata de um velho sábio da tribo, mas de um político hábil, com ideias fossilizadas num romantismo revolucionário que tantos já pagaram com a própria liberdade. No fim das contas, seu maior feito talvez tenha sido convencer o mundo de que viver modestamente é sinônimo de governar moralmente. Porém, não é.