Uma fronteira que uniu a República Dominicana e o Haiti por quase dois séculos está agora completamente fechada, conforme anunciou o presidente dominicano, Luis Abinader, na quinta-feira passada, e executada em menos de 24 horas. Esta medida, que inclui o fechamento das fronteiras marítimas e conexões aéreas, desencadeou uma mobilização de forças policiais e militares, incluindo o desdobramento de veículos blindados e helicópteros.
A tensão entre os dois países tem aumentado nos últimos tempos, em grande parte devido à crise de governabilidade que afeta o Haiti devido à ação de grupos criminosos que Porto Príncipe não conseguiu controlar. Isso levou dezenas de milhares de haitianos a cruzar a fronteira para a República Dominicana, mas em muitos casos, eles acabaram sendo deportados pelo governo de Abinader.
No entanto, o fechamento da fronteira, que é indefinido, não está relacionado principalmente ao fluxo de haitianos para a República Dominicana, mas sim a uma disputa em torno de um recurso vital compartilhado: a água do rio Masacre, também conhecido como Dajabón.
Este rio de 55 quilômetros tem servido como um divisor de fronteira entre os dois países desde o final do século XVIII. Há anos, no lado haitiano do rio, começou a construção de um “canal de irrigação” para combater a seca nas terras agrícolas de Maribaroux.
Segundo a ONG Crisis Group, as obras neste canal foram suspensas após o assassinato do presidente haitiano Jovenel Moïse em julho de 2021. No entanto, diante da inação das autoridades haitianas, a construção foi retomada de forma privada por grupos agrícolas haitianos.
O governo de Abinader questionou essa obra, alegando que ela desviaria a água do rio e ameaçaria tanto a segurança quanto a soberania da República Dominicana. Além disso, argumenta que essa ação viola o Tratado de Paz e Amizade Perpétua e Arbitragem de 1929, bem como outros acordos fronteiriços assinados por ambos os países.
Representantes de ambas as nações estavam em meio a negociações para resolver o conflito, quando Abinader anunciou o fechamento das fronteiras e se retirou da mesa de diálogo até que o Haiti suspenda os trabalhos no canal.
O governo haitiano, em resposta, afirmou que sempre favorecerá o diálogo e destacou que as conversas estavam progredindo bem até que Abinader tomou uma “ação unilateral”. Além disso, rejeitou o argumento de que não tem autoridade para realizar a obra e afirmou que o Haiti pode decidir soberanamente sobre a exploração de seus recursos naturais.
Em meio a essa disputa, Jean Brévil Weston, líder do grupo de agricultores que trabalham no canal, afirmou que as obras não serão interrompidas, declarando que “é o canal ou a morte. Estamos prontos para ser enterrados junto ao canal”, segundo a agência de notícias AP.
Antes do fechamento da fronteira, a República Dominicana já havia suspendido a emissão de vistos para haitianos e fechado a fronteira perto da cidade fronteiriça de Dajabón, onde muitos comerciantes haitianos realizavam transações de compra e venda várias vezes por semana.
O fechamento da fronteira, na tentativa de resolver a disputa em torno da água do rio Masacre, aumentou a tensão entre a República Dominicana e o Haiti, duas nações que compartilham mais do que uma ilha, compartilham uma história e desafios comuns que exigem soluções diplomáticas.